O fundador da Cosan e atual presidente do Conselho de Administração da companhia, o empresário Rubens Ometto, afirmou nesta quinta-feira (28/8) que as revelações da Operação Carbono Oculto, deflagrada para desarticular esquema bilionário de fraudes e lavagem de dinheiro no setor de combustíveis que envolve integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC) e fintechs e fundos de investimentos da Faria Lima, não são novidade no setor e já ocorrem há muito tempo.
As declarações de Ometto foram dadas durante sua participação no 33º Congresso & Expo Fenabrave, em São Paulo. Na véspera, o evento recebeu o presidente do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo.
Há quase duas décadas, em 2008, a Cosan comprou a Esso, buscando se consolidar no mercado de distribuição por meio de marcas como a rede de postos Esso e a Mobil (de lubrificantes).
Segundo Ometto, a operação foi sacramentada em um cenário no qual a adulteração de combustíveis e a evasão fiscal já se faziam presentes no setor, impondo enormes desafios à fiscalização e dificultando a livre concorrência.
“Compramos a Esso por causa disso que está nos jornais, de adulteração de combustíveis, entre outras coisas”, disse Ometto.
O empresário afirmou ainda que, na época da compra da Esso pela Cosan, era de conhecimento público a atuação de organizações criminosas no setor de combustíveis. Ometto disse que, na época, muitos investidores deixaram o país com medo de se tornar alvo de facções.
“Mas isso tem que acabar. A ilegalidade é um câncer que está tomando conta do nosso país”, completou o empresário.
No fim da manhã desta quinta-feira, as ações da Raízen (empresa da Cosan que atua no setor de distribuição de combustíveis por meio da marca Shell) disparavam mais de 10% na Bolsa de Valores (B3). Questionado a respeito, Ometto brincou: “Só isso?”.
Em 2011, a fusão entre a Shell e a Cosan levou a Raízen, até então a controladora da rede de negócios, a fechar todos os postos da marca Esso no Brasil. A Cosan optou pela manutenção da bandeira Shell.
A Cosan é uma empresa do agronegócio que atua em diversos setores da economia, como energia, gás e lubrificantes. Trata-se de uma holding que investe em empresas como Raízen, Comgás, Moove e Rumo. A Cosan também tem atuação no setor sucroenergético, com a produção de etanol e açúcar, e na distribuição de combustíveis.
Operação envolve PCC e Faria Lima
Na mira dos investigadores, estão vários segmentos da cadeia de combustíveis que eram controlados pelo crime organizado, entre os quais a importação, a produção, a distribuição e a venda para o consumidor final.
Para isso, os grupos criminosos tentavam “blindar” ou ocultar o patrimônio – e faziam isso por meio de fintechs e fundos de investimentos, o que acaba ligando as fraudes reveladas pela operação à Faria Lima, centro financeiro da maior cidade do país.
Segundo a Receita Federal, as investigações apontaram que “o sofisticado esquema engendrado pela organização criminosa, ao mesmo tempo que lavava o dinheiro proveniente do crime, obtinha elevados lucros na cadeia produtiva de combustíveis”.
“O uso de centenas de empresas operacionais na fraude permitia dissimular os recursos de origem criminosa. A sonegação fiscal e a adulteração de produtos aumentavam os lucros e prejudicavam os consumidores e a sociedade”, afirma a Receita.
Os suspeitos de envolvimento no esquema usavam importadoras que atuavam como “interpostas pessoas, adquirindo no exterior nafta, hidrocarbonetos e diesel com recursos de formuladoras e distribuidoras vinculadas à organização criminosa”.
Um dos pontos cruciais da organização criminosa, de acordo com as investigações, era a blindagem do patrimônio dos envolvidos. “Os valores eram inseridos no sistema financeiro por meio de fintechs, empresas que utilizam tecnologia para oferecer serviços financeiros digitais. A Receita Federal identificou que uma fintech de pagamento atuava como ‘banco paralelo’ da organização criminosa, tendo movimentado mais de R$ 46 bilhões de 2020 a 2024”, afirma a Receita.
Os criminosos controlavam várias instituições de pagamento menores, criando, assim, uma espécie de camada dupla de ocultação do patrimônio. “A fintech também recebia diretamente valores em espécie. Entre 2022 e 2023, foram efetuados mais de 10,9 mil depósitos em espécie, totalizando mais de R$ 61 milhões. Este é um procedimento completamente estranho à natureza de uma instituição de pagamento, que opera apenas dinheiro escritural”, afirmam os investigadores.
Ainda segundo a Receita, a “utilização de fintechs pelo crime organizado objetiva aproveitar brechas na regulação desse tipo de instituição”. “Essas brechas impedem o rastreamento do fluxo dos recursos e a identificação, pelos órgãos de controle e de fiscalização, dos valores movimentados por cada um dos clientes da fintech de forma isolada.”
De acordo com a Receita Federal, já foram identificados pelo menos 40 fundos de investimentos, com patrimônio de R$ 30 bilhões, ligados ao PCC. Eles eram, em sua maioria, fundos fechados com um único cotista – em geral, outro fundo de investimento, o que aumentava as camadas de ocultação do patrimônio.
Entre os bens adquiridos por esses fundos, estão um terminal portuário, quatro usinas produtoras de álcool, 1.600 caminhões para transporte de combustíveis e mais de 100 imóveis.
Segundo a Secretaria da Fazenda de São Paulo, as ilegalidades já teriam causado um prejuízo de mais de R$ 7,6 bilhões em impostos federais, estaduais e municipais.
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