O economista Roberto Campos Neto, ex-presidente do Banco Central (BC) e atual chefe de políticas públicas do Nubank, afirmou nessa terça-feira (23/9) que a evolução dos ativos digitais está resultando na diminuição da função crédito dos bancos.
As declarações do ex-chefe da autoridade monetária foram dadas durante evento em São Paulo.
Segundo Campos Neto, esse movimento estaria sendo impulsionado, principalmente, pelas stablecoins, com a retirada do dinheiro que antes ficava depositado nas instituições financeiras em moeda soberana.
Em linhas gerais, as pessoas estariam, cada vez mais, tirando dinheiro dos bancos para colocar em carteiras de criptomoedas. Com isso, diminui a quantidade de reais disponível no balanço dos bancos para conceder empréstimos.
As stablecoins são um tipo de criptomoeda projetada para manter uma estabilidade de valor. Elas ancoram seu preço a ativos do mundo real, como como o dólar norte-americano, ou mesmo commodities, como o ouro.
“O crescimento de stablecoin e ativo digital é muito grande. Se você tem um ‘wallet’ [uma carteira] para transacionar ativo digital, você diminui a capacidade dos bancos de fazer crédito”, disse Campos Neto.
De acordo com o ex-presidente do BC, as stablecoins acabam favorecendo o Tesouro dos Estados Unidos porque aumentaram, significativamente, a demanda pelos “treasuries” por parte das emissoras de stablecoins.
Os “treasuries” são títulos de dívida emitidos pelo governo norte-americano para financiar suas atividades e despesas.
“Está desintermediando crédito e política monetária porque tem menos moeda como canal de crédito e dinheiro como depósito”, afirmou Campos Neto.
O ideal, diz o economista, seria “fazer a inserção de tokenização no balanço dos tokens, forçando os bancos a olharem para os ativos em base de tokens, e não em base de contas”.
Governos “não tratam bem suas moedas”, diz Campos Neto
Em sua participação no evento em São Paulo, Roberto Campos Neto afirmou também que governos ao redor do mundo não vêm “tratando bem” suas moedas, o que teria aumentado o endividamento em diversos países e enfraquecido divisas.
“Não dá para dizer que os governos, em geral, estão tratando muito bem as moedas nos últimos tempos. A gente está com um nível de dívida muito elevado em vários lugares e há uma percepção de falta de habilidade ou de falta de condições dos governos de fazerem as dívidas em vários lugares do mundo, incluindo os EUA, convergirem”, afirmou Campos Neto.
“Os EUA sempre são uma liderança nesse sentido e a gente tinha uma regulamentação lá, até um tempo atrás, que inibia e afastava o setor bancário tradicional do setor de ativos digitais. Eu acho que esse afastamento diminuía a intensidade e o desejo das pessoas de investir. Isso foi revertido, em parte”, completou.
Trajetória
Roberto Campos Neto exerceu a presidência do BC entre fevereiro de 2019 e 31 de dezembro de 2024, durante os governos do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) – com quem travou uma série de embates, duramente criticado pela elevada taxa de juros no país.
Durante seu mandato, Campos Neto foi premiado como o “banqueiro central do ano”, por três anos consecutivos, pela revista LatinFinance. Em 2020, também conquistou o prêmio da revista The Banker.
Antes de chegar à presidência da autoridade monetária brasileira, Campos Neto passou por diversos cargos no setor financeiro privado, em empresas como Santander, Claritas Investments e Bozano Simonsen.
Desde julho, Campos Neto é vice-chairman e chefe global de políticas públicas do Nubank. Ele já havia sido anunciado pela plataforma de serviços financeiros digitais em maio deste ano, mas estava cumprindo o período de quarentena de seis meses, obrigatório depois de sua saída da presidência do BC.
Além da posição na estrutura de liderança do Nubank, Campos Neto também é membro não independente do Conselho de Administração da Nu Holdings.
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