O diretor de Política Econômica do Banco Central (BC), Diogo Guillen, classificou o cenário econômico global como mais “adverso” e “incerto”, o que acaba impactando a condução da política monetária do Brasil.
As declarações foram dadas nesta segunda-feira (18/8), durante um evento promovido pela Warren Investimentos, em São Paulo.
No painel que contou com a sua participação, Guillen reiterou o conteúdo da ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, que manteve a taxa básica de juros (Selic) em 15% ao ano, o maior patamar em quase duas décadas, desde 2006.
“O comitê está bem alinhado sobre onde estamos, a comunicação que temos feito e qual deve ser a comunicação subsequente. O cenário externo está mais adverso e incerto. Desde o início do ano, estamos falando em um cenário incerto em função da política comercial dos Estados Unidos”, disse Guillen, em referência ao tarifaço de 50% imposto pelo governo do presidente norte-americano Donald Trump a grande parte dos produtos importados do Brasil.
“De um lado, você poderia até pensar que há elementos para justificar uma redução na instabilidade global. Os dados de inflação [nos EUA] estão se comportando bem. De outro lado, essas incertezas seguem muito fortes e, claro, elas cresceram com os anúncios do tarifaço na perspectiva do Brasil”, explicou Guillen.
O diretor de Política Econômica do BC observou ainda que uma discussão importante é como as tarifas vão “impactar o setor financeiro e de ativos”.
“Estamos vendo uma certa moderação no crescimento, que tem dados mistos entre setores e indicadores. Essa moderação de crescimento é esperada, há algumas reuniões já estamos tratando isso. Não deveria causar surpresa”, afirmou.
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Juros elevados por período “prolongado”
Assim como já havia afirmado em outro evento voltado ao mercado financeiro, em São Paulo, no início de agosto, Diogo Guillen disse que o Copom deve manter a taxa básica de juros em patamares elevados por um período “bastante prolongado”, como apontou a ata da última reunião do Copom.
A taxa básica de juros é o principal instrumento do BC para controlar a inflação. A Selic é utilizada nas negociações de títulos públicos emitidos pelo Tesouro Nacional no Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic) e serve de referência para as demais taxas da economia.
Quando o Copom aumenta os juros, o objetivo é conter a demanda aquecida, o que se reflete nos preços, porque os juros mais altos encarecem o crédito e estimulam a poupança. Assim, taxas mais altas também podem conter a atividade econômica.
Ao reduzir a Selic, por outro lado, a tendência é a de que o crédito fique mais barato, com incentivo à produção e ao consumo, reduzindo o controle da inflação e estimulando a atividade econômica.
“O mercado de trabalho segue dinâmico. O Caged [Cadastro Geral de Empregados e Desempregados, divulgado pelo Ministério do Trabalho e Emprego] segue em um ritmo robusto e o desemprego está nas mínimas históricas”, destacou Guillen.
“Nos últimos tempos, temos tido algumas surpresas baixistas, mas o ponto principal é que a inflação segue acima da meta”, ponderou o diretor do BC. “Ao longo dos últimos meses, a média dos núcleos [de inflação] rodou acima do que seria o intervalo compatível com o atingimento da meta, reforçando a característica de uma inflação com pressão por demanda por vários meses”, prosseguiu.
Guillen disse que, apesar de as expectativas de inflação “de curto prazo” estarem em queda, “os horizontes mais longos permanecem desancorados”, o que acaba exigindo “uma restrição monetária maior e por mais tempo”.
“A política monetária funciona e você vê ela atuando por diferentes canais, como crédito, renda, câmbio, qualquer que seja. Do lado do BC, não houve mudança na visão sobre como a política monetária funciona e qual é o seu efeito. Podemos discutir uma série de distorções estruturais, mas não é uma questão que tenha mudado nos últimos meses ou ciclos”, afirmou Guillen.
“O que temos observado é justamente essa moderação de atividade, que é o cenário antecipado pelo Copom. É uma desaceleração relevante que nós antecipávamos e tem começado a ocorrer”, prosseguiu. “O mercado fica debatendo para lá e para cá, mas o nosso ponto é o seguinte: na última reunião, quisemos continuar a interrupção do ciclo de alta da taxa de juros. Ainda estamos avaliando se essa taxa de juros é a mais adequada para levar inflação à meta. Essa comunicação reflete bem como estamos enxergando este momento”, concluiu.
Inflação
De acordo com os dados do Relatório Focus, do BC, divulgados nesta manhã, os analistas do mercado reduziram a projeção de inflação de 2025 pela 12ª semana consecutiva. A estimativa passou de 5,05%, na semana passada, para 4,95%.
Com isso, as expectativas do mercado financeiro continuam se aproximando do teto da meta da inflação deste ano, que é de 4,5%. É a primeira vez, desde janeiro deste ano, que o mercado estima a inflação de 2025 para abaixo de 5% – naquele mês, a projeção foi de 4,99%.
Para 2026, a previsão do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), termômetro oficial da inflação, também foi revisada para baixo, indo de 4,41% para 4,4%. As estimativas para 2027 e 2028 não foram alteradas em relação à semana anterior.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os preços de bens e serviços do país avançaram 0,26% em julho – o que representa um aumento de 0,02 ponto percentual em comparação a junho (0,24%). Em 12 meses até julho, a inflação acumulou alta de 5,23%, ainda acima da meta.
A inflação ficou acima do teto da meta em junho, com acumulado de 5,35%. Foi a primeira vez que um estouro foi registrado no novo regime, que utiliza o acumulado de 12 meses, chamado de meta contínua.
No regime de meta contínua, o índice é apurado mês a mês. Caso o acumulado dos meses fique acima do fixado por seis meses consecutivos, a meta é considerada descumprida.
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